quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Foi aí então que, de repente a ficha caiu.



Quando tudo de repente mudou me vi só.
Durante muito tempo vi a mesma cena diante de meus olhos, a sala vazia, sua caneca preferida no fundo do armário. 
O ambiente estava como sempre, como todas as vezes, mas totalmente vazio, como se tudo fosse diferente e completamente fora de sintonia. 
Aquelas nossas músicas que nos embalavam à passos estranhos, risadas sem sentido, e o lá lá lá de sempre, não estavam mais lá. 

Tudo era igual, mas tudo diferente. 

Decidi então trazer você de volta. 
Aquelas nossas fotos bonitas, aquelas poucas fotos foram colocadas no porta retrato, no devido lugar. 
Lugar onde nunca colocamos. Espalhei todas pela casa. 
Lembrei-me então de todas as vezes em que você pedia apenas para tirarmos uma foto, e eu todas, na grande maioria, das vezes recusava. 
Mas, momentaneamente me senti realizada, afinal ali você estava. 

Fiz seu chá preferido, usei sua caneca, sentei-me no sofá, no seu antigo lugar. 
Liguei a tv, me ajeitei. 
Coloquei almofadas, estiquei as pernas, encolhi as pernas, e nada. 
Nenhuma posição me deixava confortável... Notei então que este tempo todo você cedeu o melhor lugar para mim.   

Voltei para o meu lugar, dei um gole naquele chá quente, fechei os olhos e lembrei-me como éramos. 

Decidi no fim da tarde que iria naquele restaurante, e sentaria naquela mesa no fundo do lado direito, próximo ao banheiro, que na grande maioria das vezes sempre estava vazia. 

Me arrumei. Deu uma saudade louca de usar todos os presentes que ganhei de você, mas sabia que o look resultaria numa caça verde, sapatilha roxa, camisa azul com rosa, brincos dourados, relógio prateado, bolsa azul klein. 
Estava parecendo um amontoado de retalhos de uma costureira. 

Vesti então a roupa que você mais gostava. 
Pude escutar minha memória suas palavras de sempre: - Você é a mais linda. 
Sorri. 

No caminho lembrei-me do primeiro dia que comemos ali, a demora imensa para escolha do prato, os momentos de silêncio e a observação em cada detalhe, e gesto um ao outro. 

Nas vezes seguintes éramos reconhecidos e atendidos pelo mesmo garçom gordo, velho e careca, que sempre nos levava direto à nossa mesa, e sempre fazia o mesmo pedido, e ao final trazia aquele bolo de chocolate, o meu favorito. 


Então cheguei. 

Procurei, não vi o garçom, disseram-me que ele havia mudado de cidade fazia três meses.
 Triste fui direto à nossa mesa, mesa que estava ocupada. 
Ocupada com dois jovens, conversando e acariciando a mão um do outro. 

Me assustei, e de repente a ficha caiu. 

Vi que tudo ao meu redor estava mudando, que ali naquela mesa não era mais você e eu. 

Perdi a fome, sai do restaurante, voltei para casa. 
Mudei o caminho. 

Entrei em meu quarto, olhei-me no espelho, vi que aquilo vestido me deixava gorda. 
Reparei que aquela nossa foto que era minha preferida, eu estava vesga, e tinha um pontinho verde no seu dente. 

Lembrei-me de todas as vezes que você sempre disse que aquele bolo era doce demais.
 
Peguei a caneca que havia deixado na mesinha de centro, e notei que a mesma estava trincada, e a porcelana da alça lascada. 

Me assustei, e de repente a ficha caiu. 

Tirei meus brincos, aquele que ganhei de presente de aniversário, cinco pedrinhas estavam faltando. 

A alça da bolsa estava começando a descosturar. 

Olhei no relógio, estava marcando 15h00 

A bateria havia acabado, e nem percebi. 

Foi aí então que, de repente a ficha caiu. 






 
 





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